OS BRUZUNDANGAS
Nessa crônica, Lima Barreto com uma percepção ajuda
e crítica, não deixa escapar nada. Satiriza a fictícia nação onde ele, o
narrador, teria residido. Seus capítulos enfocam entre outros temas a
diplomacia, a constituição, transações e propinas, os políticos e ilusões.
Critica também os privilégios da nobreza, o poder das oligarquias rurais, a
futilidade das sanguessugas do erário, as desigualdades sociais, saúde e
educação tratados com desalém, enfim, mazelas parecidas com as de um país real.
No início o narrador faz referência à arte de
furtar, prosseguindo sua narrativa crítica contra os "Samoiedas" que
é uma escola literária que só valoriza o cânone literário, desprezando a
literatura oral, imitando hábitos e comportamentos estrangeiros em que nada se
enquadra com o país, como ocorria com a literatura brasileira do início do
século XX.
Em Os Bruzundangas, o escritor convencional,
parnasiano e simbolista, foi impiedosamente caricaturado por Lima Barreto
A literatura da Bruzundanga, no dizer de Lima
Barreto, foi apontada como literatura estrangeira, ou seja, sem compromisso com
os problemas brasileiros.
Lima Barreto fala de dois tipos de nobreza
existente na Bruzundanga: a nobreza doutoral e a que ele chama "de
palpite". Os doutorais os palpites são assim chamados, porque todos queriam
ser doutores a todo preço, ainda que fosse através do palpite de ter sido
nobreza, para dessa forma poderem usufruir das vantagens sociais que apenas
esse grupo desfruta. A primeira nobreza é formada pelos doutores, os que têm
diploma de nível superior. Do ponto de vista social.
Esse fascínio pelos doutores é a constatação do
bacharelismo que nos marcava, e que de certa forma ainda nos caracteriza. O
título de tratamento, doutor, foi desconstruído pela prosa de Lima Barreto, que
ainda não perdoava o fato de que os doutores recebiam tratamento especial por
parte da legislação.
Todos que exercem o poder se beneficiam dele de
alguma forma e, assim segue o narrador fazendo critica a todas as instâncias
sociais como a política, a economia confusa que destrói a riqueza do país,
denominada pelos cafeteiros da província de Kaphet. Critica a legislação, a
constituição, baseada na de um país visitado por Gulliver, que tem uma lei que
diz que se a lei, não for conveniente à situação ela não é válida, os
presidentes, que são chamados de Mandachuvas, assim como os ministros, os
heróis e os deputados, também criticam o processo democrático que é corrupto, a
ciência através da medicina, o exército e a política internacional.
A forma como as classes dominantes e burguesas tomavam
o estado de assalto era assunto constantemente criticado por Lima Barreto. Os
oportunistas, os carreiristas, os aproveitadores, os corruptos e,
principalmente, a prática do nepotismo, tão comum em nossa época, as
desigualdades na distribuição das riquezas, também eram virulentamente
denunciados pelo escritor.
Nas raízes do imaginário país grassam oportunidades
mistas, apajeadas, retrógados e escravocratas de quatro costados. Sobre os usos
e costumes das autoriadades, escreve que não atendem as necessidades do povo,
tampouco lhe resolvem os problemas.
A legislação da Bruzundanga também era criticada,
porque a constituição que elaboraram, inicialmente, seguiu aos moldes do país
dos gigantes, embora depois tenha sofrido várias alterações. As várias interpretações
da lei maior deste país, aliás, se devem em grande parte a um artigo inserido nas
disposições gerais que afirma que "toda a vez que um artigo desta
constituição ferir os interesses de parentes de pessoas da situação ou de
membros dela, fica subentendido que ele não tem aplicação no caso".
A constituição da Bruzundanga, esse estranho país,
segundo Lima Barreto, só fora efetivamente obedecida quando estabelecia
condições de elegibilidade para o Presidente da República, que eles chamavam de
mandachuva. O escolhido deveria saber ler e escrever, porém não poderia jamais
ter demonstrado qualquer forma de inteligência, e nem vontade própria, deveria
ser medíocre e toda prova. A descrição do mandachuva, que também identificava o
bacharelismo, é um dos momentos mais importantes das crônicas.
Ao desfilar suas críticas à diplomacia, Lima
Barreto afirma que a atuação dos diplomatas de Bruzundanga era mera decoração,
um antro de bonequinhos vazios e empolados, que fingiam representar um país de
terceira ordem. Em outro êxito as críticas ao Barão do Rio Branco são
indisfarçáveis, bem como a insinuação à reforma que o prefeito Pereira Passos
fazia no Rio de Janeiro, que se pretendia a Paris dos trópicos, para servir aos
estrangeiros.
Comicamente o abeso visconde de Pancome se tornou
ministro e herói nacional ao escalar uma montanha. Ao assumir o posto de embaixador
na Europa, ganhou fama pelas propinas e jantares oferecidos aos estrangeiros,
mas, principalmente, por demitir todos os funcionários mestiços de seu país que
trabalhavam na embaixada. Lançava labéus de vergonha aos compatriotas de tal
extração. Em seguida, convenceu o presidente que o país devia ser conhecido na
Europa por meio de uma imensa campanha publicitária e em anúncio nos jornais. O
Barão do Rio Branco parece ser o alvo preferido de Lima Barreto.
Os ministros não deveriam entender nada das causas
da pasta que iriam dirigir. O que se exigia deles é que fossem bons
especuladores, agiotas, sabendo organizar trustes, etc., e os deputados não
deveriam ter opinião alguma, apenas aquelas dos governadores das províncias que
os elegeram. As províncias não poderiam escolher livremente seus governantes,
as populações tinham de escolher entre certas e determinadas famílias,
aparentadas pelo sangue ou afinidade o escritor tentava mostrar como a
tributação sufocava a economia e estrangulava o potencial nacional de vantagens
comparativas. Lima Barreto procurava entender como o modelo fica limitava o
crescimento econômico, abafando suposta galinha dos ovos de ouro. É então que
aparece no texto mais um doutor, especialista em finanças, e ligado à política.
Bruzundanga era um país idílico, entretanto,
pintado pelo escritor com imagens muito realista, Lima Barreto imaginou que
"(...) as cidades vivem cheias de carruagens, as mulheres se arriam de
jóias e vestidos caros, os cavalheiros chiques se mostram, nas ruas com
bengalas e trajos apurados, os banquetes e as recepções se sucedem. Não há
amanuense do Ministério do Exterior de lá que não ofereça banquetes por ocasião
de sua promoção ao cargo imediato”.
1. ANÁLISE DA OBRA
1.1. Espaço
É o lugar onde acontecem os fatos. Ele pode ser
descrito detalhadamente ou suas características podem aparecer diluídas na
narração. Nesse romance o espaço é Bruzundangas, país imaginário que apresenta
o nepotismo, as relações de privilégios políticos, propinas, desmazelos com a
saúde, a educação, etc.
Tempo
Na narrativa o tempo é cronológico, pois transcorre
na ordem natural dos fatos no enredo.
Personagens
·
Principal:
Narrador.
·
Secundários:
Sociedade da Bruzundanga formado por mandachuvas,
ministros, deputados, frades e monges estrangeiros.
Não há personagem uma vez o próprio narrador
e o único personagem da história e é um narrador-personagem.
SOBRE O AUTOR
LIMA BARRETO
Afonso Henriques de Lima Barreto nasceu no Rio de
Janeiro no dias 13 de maio de 1881 e morreu na mesma cidade no dia primeiro de
novembro de 1922. Foi aluno de vários colégios do Rio de Janeiro. Em 1897,
matriculou-se na escola Politécnica, mas desistiu antes de terminar o curso.
Além de consta dos costumes da sociedade do seu tempo, Lima Barreto foi um dos
mais expressivos romancistas brasileiro.
No jornalismo, dispersou a sua atividade pelas
revistas Brás Cubas, Careta, Fon-Fon, O malho e por muitos jornais que se
publicaram na época. Os seus romances tornaram-se populares por um penetrante
cunho humorista e satírico, que envolvia as situações e os personagens.
Dois livros que publicou, sabem-se: Recordações do
Escrivão Isaías Caminha, romance (1909) triste em que Policarpo quaresma,
considerado o melhor dos seus romances (1916); Numa e Minfa romance (1918);
Vida e Morte de M.J.Gonzaga de Sá romance escrito em 1908, mas somente
publicado, por Monteiro Lobato, em 1919; Histórias e Sonhos, contos (1920). Os
Bruzundangas Sátiros (1922). Postumamente, saíram: Bagatelas, crônicas (1923);
e a novela Clara dos Anjos, que apareceu na revista Souza Cruz em 1923-1924 e
depois foi publicada em livro, em 1948.
Lima Barreto foi o critico mais agudo da época da
republica velha no Brasil mais o nacionalismo eufanista e pondo a nu a roupagem
da república, que manteve os privilégios de famílias aristocráticas e dos
militares. Em sua obra, de temática social, privilegiou os pobres, os
arruinados. Foi se vera mente criticada pelos seus contemporâneos parnasianos
por seu estilo despojado, Fluente e coloquial, que acabou influenciado os
escritores modernistas. Também queria que a sua literatura fosse militante.
Escrever tinha finalidade de criticar o mundo
circundante para despertar alternativas renovadoras dos costumes e de práticas
que, na sociedade, privilegiavam pessoas e grupos. Para ele, o escritor tinha
uma função social.
Conhecido na sua época como “escritor mulato”, Lima
Barreto não fora aceito como o grande escritor que é: Confundiram o artista e o
homem. Como se sabe, Lima era alcoólatra, enfrentou internações em hospícios, e
principalmente, não escreveu para as elites. Era um gênio rebelde, por isso
socialmente incompreendido. Ora, aos gênios não se pergunta a cor. Mulato, sim,
Lima teve sua vida pobre e miserável, sobrevivendo às duras apenas ente a
genialidade de escrito e os fracassos de homem. Mas ele, com mestria, souberam
adentra os labirintos da psique sócio-ideológica do Brasil entre o final dos
Impérios e os limiares da república Velha, e isso sem que se perdesse lá. Tanto
que nos desvendou vários tipos sócios brasileiros reinventando o país cultural
e social jecamente através de romances exemplares e da falsa fábula dos
Bruzundangas.